ANO BISSEXTO: Não. Claro que não! Definitivamente, não! Sim, ninguém gosta de esperar.
Esperar tanto não é bom que foram inventadas algumas expressões ou ditados para nos reconfortar enquanto amargamos os intermináveis segundos de cada espera a fim de nos estimular ao exercício da elevada virtude da paciência, ensinando que “o apressado come cru”. “quem espera sempre alcança”, “tudo vem a propósito, a quem sabe esperar”, “esperar é virtude do forte”, dentre outros …
Imagino que as pessoas que inventaram esse tipo de adágio se referissem à ansiedade e à angústia das longas e, por vezes, dolorosas esperas e jamais sonhariam que a impaciência pudesse ser despertada pela espera por poucos minutos ou segundos como ocorre nestes tempos digitais em que o insólito reloginho que antecede ao envio da mensagem “instantânea” pode ser o causador de uma verdadeira taquicardia ansiolítica.
É bem verdade, no entanto, que a tecnologia tem sido uma grande aliada na redução do tempo de espera na maioria das atividades e se até algum tempo atrás, esperar, apesar de sempre indesejado, era visto como algo natural da vida e coisas triviais do dia-a-dia como esperar pelo ônibus ou para pegar um táxi nos exigiam uma certa dose de paciência, hoje porém, com o aplicativo certo, isso se tornou impensável, o mesmo ocorrendo com tantas outras esperas diárias que estão cada vez mais mínimas ou mesmo sendo eliminadas de nossa vida diária graças aos novos inventos.
Bom, se pelo lado das tarefas práticas parece que a tecnologia tem se saído bem, no aspecto subjetivo, que faz a espera de horas parecer de semanas e, destas, meses e, desses, anos, parece não ter havido grande avanço e talvez não esteja ajudando muito na forma como nós, seus usuários, lidamos com a ansiedade experimentada enquanto aguardamos, pois, nesse aspecto, a menor espera, ainda que sejam por apenas alguns milissegundos, parece ser eterna, chegando mesmo a parecer que quanto mais o tempo diminui mais o desejo pelo imediato aumenta.
Ainda que os novos tempos transformem as coisas de formas que nem imaginamos uma das esperas que talvez nunca mude seja o aguardo ansioso pela festa de aniversário quando se é criança, quando o passar do tempo parece congelado, tornando angustiante a expectativa por aquele dia único no ano, diferente de todos os outros, mais especial do que todos os dias especiais, até mesmo que o Natal ou chegada das férias, pois, nestes todos experimentam a mesma sensação, a mesma alegria, mas no dia do aniversário, nesse dia, só o aniversariante é o motivo e a razão da alegria.
Essa espera é tanto mais sôfrega em função da incapacidade do tenro infante de contar corretamente o movimento do calendário e os faz imaginar que apenas alguns meses já são um ano ou mais e, nessas circunstâncias o espírito humano, que mesmo nos primeiros anos de vida já está apto a solucionar os problemas da existência, providencia alguma forma de ajustar a percepção do passar do tempo e aí, a referência passa a ser os aniversários dos irmãos, dos primos, dos amigos, dos vizinhos, dos colegas, de todos, enfim, levando-o à conclusão de que o tempo da festa chega para todos, menos para o pequenino ansioso ser.
É engraçado pensar nisso depois que se cresce e talvez seja difícil imaginar uma criança que não tenha passado por isso mas, o que nem sempre lembramos é que existem crianças para as quais essa espera pode ser três vezes pior, pois, algumas têm que esperar por três anos seguidos e chega a ser perturbador pensar na aflição de uma criança que está esperando seu aniversário e percebe que essa data não existe no calendário que vê em casa ou em algum comércio da vizinhança e pensa consigo: esse ano não terei aniversário???
Também não há como não pensar no paradoxo entre essas tão corriqueiras e pequenas preocupações e a grandeza dos astros envolvidos nesse tão distante e ao mesmo tempo tão presente fenômeno, indiferentes às aflições dos homens, sendo mesmo difícil imaginar os quase cento e cinquenta milhões quilômetros percorridos pela imensa e, ao mesmo tempo minúscula Terra, carregando seus bilhões de seres humanos que correm com seus afazeres e ocupações à espera dos dias melhores que virão, sendo solenemente observada pelo imponente e solitário Sol, impassível e inabalável do alto de seus milhares de milhares de anos, sem que qualquer deles seja bissexto, e exatamente por isso, incapaz de entender a agonia da espera e, muito menos, o contentamento de seu fim.
P.E.P. Carvalho