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Xinguara: fazendeiro ameaça de morte dois advogados

“Se continuar cobrando aquele valor, vai ter mortes”. Foi essa ameaça, direta, sem meias palavras, que a advogada Dayanne Sousa de Moraes diz ter ouvido, dentro do escritório dela, proferida pelo fazendeiro Milton Ribeiro de Oliveira, ex-patrão de José Roberto Santos de Sousa, cliente da profissional de Direito. O fato se deu no dia 28 de janeiro deste ano, mas ela só registrou Boletim de Ocorrência nesta segunda-feira, 5, na Delegacia de Polícia Civil de Xinguara, onde foi ouvida pelo delegado José Orimaldo Silva Farias.

De acordo com o BO, era por volta das 16 horas quando Milton de Oliveira chegou ao escritório de Dayanne Moraes, sendo recebido por ela, dizendo que queria falar sobre a ação trabalhista movido por José Roberto de Sousa, ex-empregado dele, indagando à advogada onde eles queriam chegar com aquele processo.

Dayanne respondeu que o processo está em fase de execução e que só se encerra quando o cliente dela receber a indenização no valor a que tem direito. Milton retrucou e passou a questionar pontos do processo e a advogada disse a ele que a fase de questionamentos já passou, mas ele continuou a falar, dizendo que a Justiça do Trabalho bloqueou pequenos valores das contas dele.

Tom de conversa foi ameaçador e intimidatório

A advogada disse a Milton que esses valores ainda não são suficientes para pagar a indenização do cliente dela, pois a Justiça havia determinado outra quantia. Ao que Milton respondeu que esquecessem o que determinava a sentença, pois o valor não iria ficar bom para o ex-empregado nem para eles, referindo-se também ao advogado Cícero Sales da Silva, sócio de Dayanne, e que trabalha na mesma causa.

Dayanne de Moraes, então, tentou dizer a Milton de Oliveira que não estava entendendo o que ele queria e ouviu a frase dita já em tom considerado por ela ameaçador e intimidatório: “Você está entendendo sim, porque eu estou aqui para conversar e porque eu não quero passar para a parte da ignorância”. Ela, então, tornou a indagar do homem o que ele estava querendo e foi ameaçada explicitamente: “Se continuar cobrando aquele valor, vai ter mortes”.

A advogada perguntou se ele a estava ameaçando e Milton respondeu que não, dizendo que o valor cobrado não ia dar certo e passou a perguntar pelos valores pagos de depósito recursal, sendo orientado por Dayanne a questionar o advogado dele, tendo Milton se retirado em seguida.

Acusado nega que tenha feito ameaça

O advogado Cícero Sales da Silva, sócio da colega Dayanne Souza de Moraes, também ameaçado, assim como a advogada procurou a Polícia Civil, onde registrou Boletim de Ocorrência a respeito do fato e entregou ao delegado um pen-drive com a gravação da conversa entre Milton e a advogada Dayanne.

Ele corroborou as declarações da colega e contou que, no dia seguinte às ameaças, se encontrou, na sala da OAB, no Fórum Trabalhista de Xinguara, com o advogado de Milton Ribeiro de Oliveira, Marcos Evanovich, que estava acompanhado Mariana Milza Passos, presidente da Comissão de Prerrogativas da Subseção da OAB-PA em Xinguara.

Marcos teria contado que Milton andava meio irritado porque estava tendo problemas com um fazendeiro de São Félix do Xingu e que ele próprio estava se sentindo ameaçado por seu cliente, que estava lhe culpando pela perda da ação trabalhista, afirmando que nada poderia fazer pelos colegas ameaçados.

Imediatamente, Cícero da Silva comunicou o fato ao juiz da Vara Trabalhista, que marcou uma reunião de conciliação para esta segunda-feira, 5. Milton, entretanto, não compareceu, apenas Marcos, e não houve, então, nenhum tipo de acordo, o que levou os dois advogados ameaçados a procurarem a Polícia Civil a fim de denunciarem a ameaça. Cícero relatou ainda no BO ter sido informado que Milton também havia ameaçado de morte José Roberto Santos de Sousa.

OAB-PA se mobiliza em favor dos ameaçados

A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Pará foi comunicada e enviou de Belém representantes, que, junto com colegas das Subseções de Xinguara e Parauapebas acompanharam Dayanne Souza de Moraes e Cícero Sales da Silva. A comissão foi formada pelos advogados: Mariana Milza Pereira Passos, Anderson Paulo de Oliveira Gomes, Leonardo José Gualberto Almeida, Carlos Eduardo Teixeira Chaves e Rone Messias da Silva.

Ouvido pelo Blog, o delegado José Orimaldo disse que ontem mesmo intimou Milton Ribeiro de Oliveira a prestar declarações sobre o caso, oportunidade em que o homem negou que tenha feito qualquer tipo de ameaça aos dois advogados.

“Ele disse que procurou os advogados apenas para conversar, a fim de tentar um acordo que diminuísse o valo da indenização de um ex-empregado dele que sofreu um acidente de trabalho”, contou o delegado, afirmando que já concluiu o procedimento e na manhã desta terça-feira, 6, vai comunicar o Poder Judiciário.

Fazendeiro já foi candidato a vice-prefeito de Xinguara e preso por trabalho escravo

Milton Ribeiro de Oliveira, 53 anos, foi candidato a vice-prefeito de Xinguara nas eleições de 2008. O pecuarista foi preso pela Polícia Federal, em agosto de 2004, acusado de manter trabalhadores em regime de escravidão, na Fazenda Sossego e no garimpo Corta-Goela, em Canaã dos Carajás.

A prisão do fazendeiro foi pedida pelo Ministério Público Federal (MPF). O processo contra Milton de Ribeiro começou em 2003, quando o Grupo Móvel de Fiscalização contra o Trabalho Escravo encontrou 47 trabalhadores em condições desumanas em suas propriedades. Mesmo denunciado à Justiça, ele reincidiu, e, meses depois, os fiscais do Ministério do Trabalho libertaram, nas mesmas propriedades, 28 trabalhadores.

O Blog tentou contato, sem sucesso, com o advogado Marcos Evanovich. Todas as ligações foram encaminhadas para a caixa de mensagens.

Ordem diz que as ameaças são inaceitáveis

A respeito das ameaças a dois de seus integrantes, mais de 30 advogados se reuniram na Subseção de Xinguara da OAB-PA, em apoio aos colegas ameaçados. O órgão emitiu Nota de Repúdio que segue, abaixo, na íntegra:

NOTA DE REPÚDIO

 Xinguara, 05 de fevereiro de 2019

A Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção Xinguara, torna público seu repúdio e absoluta contrariedade aos atos de ameaça e tentativa de coação praticados contra os advogados Dayanne de Sousa Moraes e Cicero Sales da Silva, ex-Presidente da OAB- XINGUARA e atual Conselheiro da OAB-PA.

A Diretoria da OAB Subseção Xinguara afirma veementemente, que atos de ameaça e intimidação, ou qualquer outra modalidade de atentado contra advogados e ou advogadas não serão tolerados e que adotará todas as providências cabíveis e necessárias para o restabelecimento da ordem e da paz.

Os advogados que foram ameaçados no exercício da profissão receberão atenção máxima desta Subseção e todas as denúncias serão apuradas de forma célere e contundente. Qualquer restrição ao livre exercício da advocacia será imediatamente repelida com reação imediata da OAB Xinguara.

A OAB, como defensora intransigente da Democracia, não pode coadunar com quaisquer atos de violência e ameaça contra qualquer cidadão, principalmente contra advogados, que estão exercendo sua atividade laboral, dentro dos limites da lei.

É inaceitável que a advocacia tenha se tornado atividade de risco, capaz de gerar angústia e desconforto. Nesse sentido, a OAB Xinguara reafirma sua defesa incondicional às Prerrogativas da Dra. Dayanne de Sousa Moraes e ao Dr. Cicero Sales da Silva, e aduz que os Profissionais estão e estarão sempre devidamente assistidos por todos que compõem o sistema OAB.

Por fim, a OAB Xinguara que sempre atuou com independência e atenta à defesa das garantias profissionais e dos direitos sociais, lamenta o fato ocorrido e presta total apoio e solidariedade aos advogados ameaçados, declara por meio desta NOTA DE REPÚDIO que utilizará de todos os meios legais admitidos para a defesa incansável da dignidade da advocacia e de seus membros, mantendo atuação enérgica e incessante no acompanhamento das medidas cabíveis a serem empreendidas pelas autoridades competentes, sempre cumprindo com sua função institucional de zelar pelo respeito às Prerrogativas dos Advogados e pelo Livre Exercício Profissional.

Evandro Santana

Presidente da OAB-XPA

Texto: Blog do João Carlos

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